O prêmio de melhor tese de ciência política do IESP-UERJ deste ano foi entregue à pesquisadora Anna Carolina Venturini, que desenvolveu em a pesquisa “Ação afirmativa na pós-graduação: os desafios da expansão de uma política de inclusão”, defendida no Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, em 2019, para obtenção do título de doutorado.
A tese, que tem entre seus objetivos explicitar como a criação de ações afirmativas resultou em significativas mudanças nos programas de pós-graduação, vem muito a calhar em um cenário político-econômico de desmonte, principalmente a nível educacional. Conceitualmente falando,
Ações afirmativas são políticas focais que alocam recursos em benefício de pessoas pertencentes a grupos discriminados e vitimados pela exclusão sócio-econômica no passado ou no presente. Trata-se de medidas que têm como objetivo combater discriminações étnicas, raciais, religiosas, de gênero ou de casta, aumentando a participação de minorias no processo político, no acesso à educação, saúde, emprego, bens materiais, redes de proteção social e/ou no reconhecimento cultural.
Grupo de Estudos Multidisciplinares da Ação Afirmativa – GEMAA/UERJ
Existe inclusão nos programas de pós-graduação?
A pesquisa da PhD em Ciência Política tomou como base de análise editais de seleção de 2.763 programas de pós-graduação acadêmicos de universidades públicas publicados, bem como entrevistas com representantes de programas, da CAPES e do MEC. Diferentemente das políticas afirmativas implementadas nas seleções que dão acesso às universidades, a nível de graduação, as ações afirmativas que deveriam dar acesso aos programas de pós-graduação ficam, muitas vezes, a critério das comissões de seleção e ainda estão muito aquém da agenda geral de políticas públicas, conforme aponta o estudo.
A tese também mostra, através de dados concretos, que os detentores de títulos de pós-graduação stricto sensu no Brasil são predominantemente brancos.
Os dados levantados na pesquisa revelam que a composição racial dos doutores está bem distante da composição racial média do país segundo o último censo demográfico, sobretudo em relação a pretos e pardos.
Fica evidente que os percentuais de pretos e pardos são muito inferiores à média nacional – menos da metade da proporção demográfica – enquanto os percentuais de brancos e amarelos são superiores à média e há equilíbrio no percentual de indígenas. Segundo a autora,
A baixa participação de pretos e pardos em cursos de pós-graduação está relacionada a um processo histórico de exclusão desses grupos das universidades brasileiras, não apenas na pós-graduação, como também nos cursos de graduação.
Anna Carolina Venturini, 2019.
Resultados
Entre alguns resultados encontrados, a pesquisa revela que apenas 26,4% dos programas possuem algum tipo de ação afirmativa.
A análise confirmou a hipótese inicial de que o argumento da meritocracia é ainda mais forte nas discussões sobre ações afirmativas para pós-graduação. A pesquisadora aponta que há uma forte resistência à realização de mudanças efetivas, que promovam a inclusão social, nos processos seletivos em razão da importância do mérito acadêmico e da excelência acadêmica, bem como da incerteza a respeito dos impactos à nota da avaliação da CAPES.
Segundo a pesquisadora, “a ausência de problemas parece ter relação com as estratégias de convencimento adotadas pelos empreendedores, especialmente no que se refere à forma de representação do problema e a apresentação de dados e informações a respeito dos benefícios que a política poderia trazer, bem como de resultados das políticas implementadas nos cursos de graduação”.
Em resumo…
Um dos pontos altos da pesquisa é a demonstração com base em dados objetivos de um dos pilares da agenda da população afrobrasileira: as intensas desigualdades regionais, étnico-raciais e econômicas. A autora, em suas palavras, revela:
a desigualdade no acesso à pós-graduação é um dos principais problemas que ensejaram o início do debate sobre a criação de ações afirmativas em prol de estudantes pertencentes a grupos historicamente excluídos nos programas e universidades públicas.
Publicitária cearense. Canceriana. Doutora e mestre em Psicologia. Amante da docência. Integrante do Grupo Interdisciplinar de Estudos, Pesquisas e Intervenções em Psicologia Social Crítica (Paralaxe-UFC). Defendeu em sua tese de doutorado um estudo sobre mulheres em transição capilar. Atualmente, dedicada aos estudos de gênero, raça, feminismos negros e decolonialidade.
Louca por fotografia, design, viajar e colecionar carimbos no passaporte. Uma pessoa extremamente curiosa.