Autor: Hilario Ferreira

Graduado em Ciências Sociais e mestre em História Social pela Universidade Federal do Ceará (UFC). É pesquisador da Cultura e História do Negro no Ceará.

“No Ceará não se embarcam mais escravos”. Era o que gritavam os negros jangadeiros na Praia do Peixe, atual Praia de Iracema, em Fortaleza, quando os comerciantes-traficantes pediam a eles que levassem cativos nas jangadas até o navio. Esses jangadeiros negros respondiam que não. O episódio ocorreu nos dias 27, 29 e 30 de janeiro de 1881. Um acontecimento que revelou duas coisas. A primeira: lideranças negras à frente do movimento, notadamente o liberto José Luiz Napoleão e a esposa, também liberta, Maria Simôa da Conceição, conhecida popularmente como Preta Tia Simoa. A segunda: uma forte organização, marcada pela consciência…

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Estamos chegando do funda da terra,estamos chegando do ventre da noite,da carne do açoite nós somos,viemos lembrar.A de Ó (Estamos Chegando)Milton Nascimento No Ceará, todo negro ou negra já foi abordado uma vez na vida e escutou a frase: “No Ceará não tem negros”. Essa afirmação comum e corriqueira entre nós de que “No Ceará não tem negros” não deve ser entendida como um comentário simples. Ela possui uma força ideológica e um efeito que extrapolam os limites do Estado. Coloca no campo da invisibilidade um conjunto de histórias e vivências de mais de um século que ainda não foi…

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O fluxo frequente do comércio atlântico e entre províncias de cativos que traziam novos escravizados do continente africano foi um, dentre vários momentos, que contribuíram para o cativo já “adaptado” à realidade local lembrar de sua identidade étnica. No caso da Província do Ceará, não havia um comércio direto com o continente africano e sim com as províncias vizinhas (Pernambuco, Maranhão e Bahia). Sabe-se que o processo de tentativa da quebra da identidade africana começava lá no continente. Na praia ou dentro do barco, havia um padre que batizava o africano e, posteriormente, um nome cristão lhe era dado. O…

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É de conhecimento de todos que o tráfico fora uma empresa que comercializava seres humanos. Estima-se que, enquanto vingou o sistema escravista no novo mundo, foram sequestrados de suas terras cerca 12 milhões de africanos para a América. Destes, 40%, ou seja, quase a metade, foi trazida para o Brasil. Os primeiros povos africanos a serem traficados para a colônia de Portugal nas Américas foram os do grupo étnico-linguístico “banto.” Quem são esses bantos? Desenho de Johann Moritz Rugendas Originários do noroeste do continente africano, onde atualmente estão localizados os países da Nigéria, Mali, Mauritânia e Camarões, os povos bantos eram agricultores,…

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O presente texto traz uma pequena reflexão sobre essa violência que atinge negros e negras e interrompe sonhos e projetos de vida como algo que vem de longe. Sabe-se que essa violência é histórica e se estrutura ao longo do tempo, criando formas complexas e racionais de dominação que deviam garantir a eterna subjugação dos negros e negras aos brancos em nossa sociedade. Sim, essa estrutura de dominação sustenta privilégios e garante o poder dos brancos, já que não há racismo sem branquitude. Como diz o rapper americano Talib Kweli, “nenhuma pessoa branca que vive hoje é responsável pela escravidão,…

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O historiador George R. Andrews, na sua mais recente obra traduzida aqui, América Afro-latina, 1800-20001, desenvolve uma análise comparativa das relações raciais no Brasil e noutros países da América Latina, revelando uma situação interessante: o fato de pensarmos que a ideologia da democracia racial, o processo de branqueamento (interessante que não considera uma ideologia e sim uma política de Estado), o racismo dissimulado e a resistência de brancos à mobilização social e política dos negros não foram exclusividade da nossa história. O autor fala que seria um equívoco pensar dessa forma. Revela que todas estas questões relacionadas as relações raciais…

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