No decorrer da vida, você conhece inúmeras personalidades importantes para a história. Mas já observou a lacuna de personalidades negras nas narrativas oficiais? O embranquecimento generalizado no Brasil é fruto do convencimento da elite intelectual branca, que se utilizou de artifícios científicos para legitimar violências simbólicas e concretas.
Nesse contexto, é notória a invisibilização das pessoas negras e dos seus modos de vida, uma vez que as estruturas sociais brasileiras estão substancialmente ligadas ao poder branco. O ideal de superioridade branca alcançou todas as camadas da sociedade e apresentou-se como pedra angular do país. A inexistência de personalidades negras nos livros, por exemplo, é fruto das marcas coloniais que ainda ferem os corpos.
Grandes nomes da literatura, da música, da política e de tantas outras áreas e saberes tiveram traços fisionômicos apagados. O embranquecimento de personalidades negras é uma das nuances das violências a que a negritude foi submetida, deixando evidente as artimanhas da branquitude para impedir o protagonismo negro construção da história do Brasil.
A imagem tem poder de construção no imaginário social. A grande embarcação navegante do atlântico brasileiro está posta há séculos. Dentro dela, a branquitude tentou aprisionar as formas de viver e expressar da negritude. Foram utilizados artifícios rebuscados de apagamento.
Este cenário traz à tona um trauma coletivo e histórico do colonialismo expresso no racismo cotidiano. O pensador Frantz Fanon no livro “Pele Negra, Máscaras Brancas” deixa evidente os esforços da branquitude para retratar sujeitos negros como “o outro” e a si próprios (brancos) como modelo inquestionável de ser e existir.
A escritora Grada Kilomba, por sua vez, mostra em seu livro “Memórias da plantação” que a construção das imagens não é neutra. A máscara colonial tenta a todo custo silenciar corpos negros. O apagamento imagético de personalidades negras foi construída pelas mãos da fantasia colonial, que se arrasta há séculos.
Tendo em vista esse contexto, é preciso lembrar que a história que aprendemos na escola foi construída por mãos brancas. Sendo assim, pessoas negras têm tomado para si a responsabilidade de recontar os passos da negritude num contexto afro diaspórico delicado como o do Brasil. Portanto, se faz necessário evidenciar personalidades negras que sofreram a violência do embranquecimento e mais uma vez reafirmar a sua re-existência.
- Chiquinha Gonzaga
Musicista brasileira, filha do casal interracial Rosa Maria de Lima (ex-escravizada) e José Basileu Gonzaga, militar de origem aristocrata. Chiquinha foi pioneira por incorporar elementos populares à música clássica, construindo novos paradigmas para a música brasileira. Compositora de canções conhecidas como “Ô Abre Alas” (1899), a pianista foi a primeira mulher negra a reger uma orquestra no Brasil e lutou durante anos por leis que regulamentam os direitos autorais de artistas. É fato que Chiquinha tinha a pele mais clara que a da sua mãe, mas em 1999 foi representada pela atriz Regina Duarte (branca) na minissérie exibida numa importante emissora da TV aberta, escancarando o processo de embranquecimento a que esta personalidade negra foi submetida.
- Machado de Assis (1839 – 1908)
Joaquim Maria Machado de Assis é um escritor de relevância na literatura brasileira. Escreveu mais de 30 livros, entre contos, crônicas, romance e poesia. Também ocupou uma cadeira na Academia Brasileira de Letras por mais de uma década. Em 2011, foi retratado como branco por uma propaganda de um dos maiores bancos do país. A publicidade saiu de circulação por pressão da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República (Seppir-PR) e retornou ao ar com um ator negro como intérprete.
- Maria Firmina dos Reis
Professora maranhense responsável pela fundação da primeira escola mista e gratuita do estado onde nasceu. Enquanto escritora, publicou poesias, crônicas e ficção, entre elas a obra Úrsula (1859), entendida como o primeiro romance abolicionista do Brasil, sendo esta também a primeira obra de ficção publicada por uma mulher negra da América Latina.
- Nilo Peçanha
Se engana quem acha que o Brasil nunca teve um presidente negro. Em decorrência do falecimento de Afonso Pena, Nilo Peçanha assumiu a Presidência da República entre junho de 1909 e novembro de 1910. Nilo participava ativamente da campanha abolicionista. Pesquisadores afirmam que as fotografias oficiais foram retocadas para branquear a pele do então presidente. O seu mandato foi responsável pela criação do Serviço de Proteção ao Índio (SPI).