O Grupo de Valorização Negra do Cariri (Grunec) completou 20 anos nessa terça-feira (21/4). O coletivo é instrumento de importantes movimentações ligadas ao combate à discriminação, ao preconceito e ao racismo no interior do Ceará.
Tudo começou em 2000, após Luciano Carvalho, Verônica Carvalho, Maria Eliana de Lima, Adriano Almeida, Janaina Costa, Zildene Pereira, Risomar Alves, Charles Farias e Cícero Erivaldo refletirem sobre a realidade da negritude brasileira e cearense. A discussão teve como pano de fundo a Conferência de Durban, promovida naquele período pela Organização das Nações Unidas (ONU) contra o racismo, a discriminação racial, a xenofobia e formas correlatas de intolerância.
A conversa impulsionou os indivíduos a transformar lutas individuais em ação coletiva. E, assim, eles fundaram a organização que naquele momento pretendia responder a duas perguntas: existem negros no Ceará? Quais contribuições esses negros deixaram para o nosso território?
Segundo Valéria Carvalho, educadora popular e membro do grupo, a data de fundação do Grunec (21 de abril) não foi escolhida à toa, pois “enquanto o Brasil celebra um “herói” nacional nós celebramos o nosso verdadeiro herói que é Zumbi dos Palmares”. Para a ativista, ao longo das duas décadas, o grupo se pautou na “busca da dignidade que vem a partir do conhecimento da nossa história.”
Desde 2000, a organização já desenvolveu inúmeras atividades relevantes. Ações como o mapeamento das comunidades negras e quilombolas do Cariri cearense, que colocou essas regiões oficialmente no mapa do Estado.
Além disso, o Grunec contribui há dez anos com a construção da caminhada contra a intolerância religiosa realizada anualmente em Juazeiro do Norte e foi pedra angular para a realização da Marcha das Mulheres Negras do Cariri, realizada em 2015.
Hoje, o grupo tem proposto e atuado em questões ligadas à educação, saúde, mulheres negras, convivência com o semiárido e juventudes negras. E tem se dedicado a ações de acolhimento e integração de imigrantes venezuelanos que chegam à Região.
Nos últimos anos, muitos jovens têm se aproximado do Grunec, o que aponta uma renovação e ampliação das proposições de luta da organização. A estudante Maria Raiane, 21, faz parte da juventude do grupo há quatro anos e se aproximou da organização num momento delicado da vida.
“Eu estava na sala de aula me sentindo mal, com bastante vontade de chorar, enquanto no Grunec estava acontecendo uma oficina de turbante. Eu saí da aula e fui pra sede do Grunec participar da oficina. No momento de partilha, pela primeira vez, eu me senti ouvida; eu me reconheci naquelas pessoas. Desde então, nunca mais abri mão de construir esse movimento.”
Raiane completa que a luta encabeçada pelo Grunec é fundamental tendo em vista que o Cariri é composto majoritariamente por afro-quilombolas e afro-indígenas. “Eu reconheci que a luta pela negritude não é só por mim, mas por todas as pessoas que moram num estado como o Ceará, que historicamente nega a existência das pessoas negras”, pontua a jovem.
O Grunec consegue unir gerações, pessoas negras sexagenárias e juventude que, apesar das diferenças e de todas as dores marcadas na pele, enxergam beleza na vida. Segundo Valéria, a maior beleza do povo negro caririense é a existência coletiva e partilha contínua. Raiane, por sua vez, destaca que conheceu o amor de estar numa organização na qual acredita, junto de pessoas que consideram importante a sua vivência.
Nesse contexto, uma palavra compartilhada constantemente por vários integrantes do Grunec é “AmorAção”, que é entendido como fórmula fundamental para o ajuntamento de forças na construção de um novo amanhã para a negritude cearense. Por isso, há 20 anos os corações pretos caririenses bradam: vida longa ao Grunec!