O filme Novos Mutantes quase não chegou aos cinemas e quando finalmente estreou, no fim do mês de outubro, cometeu erros graves na adaptação de dois personagens importantes para a trama: Dra. Reyes e Mancha Solar.
Tudo bem que a proposta do longa era trazer um dos grupos jovens dos X-Men, os Novos Mutantes, em um formato diferenciado das histórias em quadrinhos, com um ar mais dark, de suspense. Mas escolher dois atores brancos para interpretar personagens negros foi tipo retornar às épocas de blackface.
Originalmente, nas HQs, o Mancha Solar (ou melhor: Roberto da Costa) é um rapaz negro, carioca, filho de um magnata brasileiro com uma arqueóloga estadunidense, que tem o poder de absorver a radiação solar, disparar rajadas, entre outras habilidades ligadas ao sol.
No entanto, o filme nos deu um moço branco – Henry Zaga. Para justificar a escolha do ator, o diretor Josh Boone disse em entrevista ao Gizmodo que queria alguém essencialmente brasileiro, não necessariamente preto.
Meu objetivo foi encontrar o melhor ator e que conseguisse ser o mais próximo da minha visão para o personagem. Não havia ninguém que se comparasse ao Henry. Talvez se o Henry não existisse nós teríamos encontrado alguém com a pele escura e que se encaixasse naquilo que precisávamos. Mas nunca foi sobre a cor da pele dele para mim.
As afirmações do cineasta responsável pela adaptação deram a percepção de que apenas um ator branco poderia interpretar um brasileiro rico, mesmo que a figura em questão seja negra. Afinal, a branquitude faz questão de nos dizer qual é o nosso lugar.
Quando vi que o ator escolhido para o Mancha Solar era branco, me enchi de raiva. Porque é a segunda vez que isso acontece. Na primeira adaptação de Beto para as telonas, em X-Men: Dias de um Futuro Esquecido, ele foi interpretado por Adam Canto, um ator mexicano branco.
Nem parece que há dois anos estávamos celebrando Pantera Negra nos cinemas. Por mais que tenha me sentido representada nele, gostaria muito de ver super heróis brasileiros e negros em um live-action. Ainda mais uma personalidade que foge da narrativa do preto pobre que vemos na indústria do entretenimento de forma tão recorrente.
Eu mal sabia que o pior estava por vir quando descobri que a Dra. Reyes tinha sido embranquecida também. Cecília Reyes é uma mulher preta, médica especialista em trauma, nascida em Porto Rico e que tem como habilidade gerar campos de força. Ela não se interessa em ser uma super heroína, mas sempre que é preciso auxilia os X-Men em alguma missão.
A atriz brasileira Alice Braga foi quem interpretou a Cecília no filme e eu não pude ficar mais enojada. Para quem cresceu se odiando por causa do padrão branco, é inaceitável ver um papel que poderia trazer mais representatividade a meninas negras sendo feito por uma mulher branca.
O diretor nem se deu o trabalho de justificar tal escolha. Talvez por se tratar de uma mulher preta, ele não pensou que merecia tanta atenção. Ainda mais quando se trata de uma personagem ainda desconhecida das pessoas que não fazem parte do nicho “geek.”
Minha conclusão sobre Novos Mutantes é: não se dê o trabalho de sair de casa para assistir um longa-metragem tão preguiçoso.
Estudante de Jornalismo da Universidade Federal do Ceará, foi repórter no Grupo de Comunicação O Povo. Comentarista do programa Último Tempo, na webrádio Cruzamento da turma da UFC de 2017.2. É formada em balé clássico pela Escola de Ballet Janne Ruth. Gosta de ficção científica, um bom romance clichê e é apaixonada por futebol, super-heróis e arte.