Mulheres negras que militam e atuam em diferentes áreas vão debater, a convite da Coordenadoria Especial de Políticas Públicas para Igualdade Racial (Ceppir) da Secretaria da Proteção Social, Justiça, Cidadania, Mulheres e Direitos Humanos (SPS), o legado e a luta da líder quilombola Tereza de Benguela. O webinário Mulheres Negras: ancestralidade e futuro será transmitido nesta segunda-feira (26/7), a partir das 15 horas, no canal da SPS no YouTube. A titular da SPS, Socorro França, vai abrir o evento, ao lado da secretária-executiva de Justiça, Cidadania e Direitos Humanos, Lia Gomes, e da secretaria-executiva de Políticas para as Mulheres, Denise Aguiar.
Para debater o assunto, foram convidadas Zelma Madeira, assessora especial de Acolhimento aos Movimentos Sociais do Estado do Ceará; Bruna Rodrigues, juíza titular da Vara Única de Paracuru, e Antônia Araújo, ouvidora geral externa da Defensoria Pública do Estado do Ceará (DPCE). A mediação será de Martír Silva, coordenadora especial de Políticas Públicas para Igualdade Racial da SPS. As convidadas são mulheres com trajetórias diferentes que se conectam pela ancestralidade e pelo compromisso em construir um presente e um futuro com portas abertas para que outras mulheres negras ocupem todos os espaços que lhes foram negados historicamente.
“O debate racial transpõe a negritude e perpassa os vários grupos étnicos que lutam por reconhecimento. Portanto, nós seguiremos falando deste tema não só neste mês de julho, mas durante todo o ano. Mulheres como Tereza de Benguela nos referendam, nos mostram que os nossos passos vêm de longe e que precisamos conhecer nossa história para seguirmos construindo pontes para que as mulheres negras acessem seus direitos e percebam sua potência dentro desta sociedade”, aponta a advogada e mestre em Políticas Públicas, Martír Silva.
A assistente social e professora universitária Zelma Madeira destaca que além das referências ao Dia da Mulher Negra, Latino-Americana e Caribenha e de Tereza de Benguela também precisamos lembrar do Dia da Mulher Africana, celebrado em 30 de julho. “Nós, pretas, dentro e fora do continente, representamos um grupo étnico que contribuiu na Europa, América Latina, África e em todas as partes do mundo com nosso trabalho, construindo a riqueza de muitos países. Trabalho este que foi superexplorado, mas ao contrário de recebermos por esta grande contribuição, nos relegaram o lugar do trabalho doméstico, que é uma profissão que ainda guarda mais resquícios de uma naturalização da experiência da escravidão”, lembra Zelma.
A gestora ainda pontua: “São estas mulheres que estão fazendo faxina, lavando roupa e limpando as casas que estão dando todas as condições no campo de reprodução da vida, para que mulheres não negras assumam seus postos de trabalhos fora de casa. Então, nós, mulheres negras, seguimos contribuindo para a consolidação do desenvolvimento do País, ao passo em que muitas de nós experimenta ainda um padrão de vida precário, a exemplo da pandemia, em que nós ainda somos o grupo mais atingido, seja na saúde, educação ou na baixa representação política.”
Em outra ponta de atuação, mas também lutando contra todos os tipos de racismos, a juíza titular da Vara Única de Paracuru, Bruna Rodrigues, destaca que é importante falar abertamente sobre o racismo. “O racismo ainda é pouco falado em muitos lugares. As pessoas se incomodam quando falamos sobre as opressões que recaem sobre nós, mas isso não me trava e eu sigo levando este tema para todos os lugares em que sou convidada a falar, seja nas escolas, audiências, reuniões… O nosso orgulho, enquanto mulher negra, precisa chegar a outras mulheres negras, gerando representatividade, que é o que sempre tentaram tirar de nós”, ressalta a magistrada.
A ouvidora da Defensoria Pública, professora Antônia Araújo, milita desde muito cedo contra o racismo. “O que era revolta dentro de mim, logo se transformou em luta quando descobri os movimentos negros e de mulheres. Foi nestes espaços onde me senti acolhida de verdade e entendi que eu tinha uma capacidade revolucionária dentro de mim. Falar de Teresa de Benguela é falar também do apagamento histórico que nós, negros e negras, vivemos. Tereza sabia quem ela era e sabia pelo que estava lutando. Então, isso a tornava ‘perigosa’ para aquela sociedade que tentou por muito tempo apagar sua história. E é por isso que nós não podemos nos calar jamais: por ela e por tantas outras que vieram antes de nós e as que virão depois”, reflete Antônia.
Primeira dentre os sete irmãos a ingressar na universidade, Antônia traz dentro de si essa história de resistência. “Trabalhei um período no Instituto Maria da Penha e lá nós logo percebemos a necessidade de criarmos fluxos de atendimento no interior do Estado, onde a violência contra as mulheres negras me chamou atenção por vir também acompanhada do racismo. A partir desta discussão, nós percebemos o papel fundamental da Defensoria na atenção às mulheres negras e, então, criamos um projeto coletivo junto a várias instituições e movimentos para levar a justiça e o bem viver para este público”, explica a ouvidora.
Quem foi Tereza de Benguela
Rainha Tereza, como costumava ser chamada, comandou durante 20 anos o quilombo do Quariterê, uma comunidade com mais de 100 pessoas negras e indígenas no estado do Mato Grosso. A comunidade vivia do cultivo de algodão, milho, feijão, mandioca, banana e venda dos excedentes produzidos.
Segundo os registros históricos, o Quilombo que Rainha Tereza governava vivia numa espécie de parlamento, onde todas as decisões eram discutidas em grupo e havia uma estrutura de conselheiros. Tereza era bem firme, comandava toda a estrutura política, econômica e administrativa, mantendo a defesa do quilombo com a utilização de armas trocadas com os brancos ou adquiridas nos confrontos com os bandeirantes e capitães do mato, de ataque à comunidade quilombola.
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